Ando mais favorável às pesquisas, principalmente pelo fato da lei prever que os embriões que se pretende utilizar nas pesquisas são aqueles descartados nos processos de inseminação artificial, congelados há mais de três anos e cujo uso tiver sido autorizado pelo casal.
Entendo dois argumentos dos que defendem a não utilização das células como bastante sólidos. O primeiro está traduzido no texto de Maria Garcia (professora de Direito constitucional e educacional na PUC-SP) publicado na matéria do Aliás:
"(...)A pergunta seguinte é: o embrião é humano?Está vivo?Ambas as respostas serão, inequivocadamente, afirmativas, senão a lei não disporia sobre elas. Se afirmativas, aos embriões humanos estende-se o direito à vida. É o que diz na Constituição."
Aqui, Maria refere-se à análise do jurista José Afonso da Silva sobre o artigo 5o do texto constitucional, reproduzido anteriormente "Vida,(...), é um processo vital que se instaura com a concepção, transforma-se, progride mantendo sua identidade, até que muda de qualidade, deixando, então, de ser vida para ser morte.(...)Tudo o que interfere em prejuízo deste fluir espontâneo e incessante contraria a vida."
Mas, no mesmo texto, a autora transcreve o seguinte: "Acima de tudo, todavia, é necessário ficar claro, conforme duas frases da juíza Jutta Limbach, ex-presidente da Suprema Corte Alemã que (1) 'A Ciencia do Direito não é competente para responder à questão sobre a partir de quando começa a vida humana' e (2) 'As ciências naturais, em virtude de seu conhecimento, não estão em condições de responder à questão a partir de quando a vida humana deve ser colocada sob a proteção da Constituição'.Cabe apenas cumprir a Constituição(...)"
Aqui cabe uma pergunta de leigo (presente!): o que é a Constituição, no seu sentido mais amplo? Em que medida devemos ficar presos a ela e em que medida ela deve ser ajustada aos novos conhecimentos?
O segundo é o fato de estarmos no Brasil. Infelizmente, já provamos que, muitas vezes, as leis e os mecanismos de regulamentação não têm, na prática, o papel que lhes foram atribuídos. Existe um risco consideravel de perdemos o controle nas questões da comercialização dos embriões e, consequentemente, da sua produção.
Os argumentos da Igreja não me convencem posto estarmos em um Estado laico onde a crença individual deve ser mantida em caráter individual.Sobre isto, na mesma matéria, Dulce Xavier (socióloga e integrante da ONG Católicas pelo direito de decidir), escreve: "Portanto, o debate público que interessa à sociedade não é sobre 'quando começa a vida', mas sobre a imposição de uma determinada visão católica a todo o conjunto de regras que cidadãos devem seguir."
Eu não poderia concordar mais...
Na mesma matéria do Estadão, há uma entrevista (da jornalista Monica Manir) com a psicanalista Debora Seibel. Debora é parceira de uma clínica de fertilização paulistana e, como psicanalista, "acolhe as agruras dos casais que tentam engravidar por meio de métodos artificais".
Vou transpor alguns trechos da entrevista (aqui cabe uma explicação rápida: durante o processo de fertilização, acontece de mais de um embrião ser produzido pelo casal. Quando o casal engravida dos embriões frescos, guarda-se os outros embriões congelados em nitrogenio e o casal paga uma taxa de manutenção para a clínica que, de tempos em tempos, pergunta ao casal que destino deve ser dado a eles):
"Como os casais reagem aos embriões congelados?
(...) A questão é que, quando o casal engravida dos embriões frescos, os congelados passam a ser um problema.
Por que?
Porque o casal não consegue mais pensar neles.(...)Como não pode haver descarte de embriões, a clínica telefona de tempos em tempos para saber se o casal deseja utilizá-los. O mais ouvido é "depois a gente vê o que faz".Os pais estão meio alheios, meio regredidos, pois o processo para chegar à gravidez por meio de fertilização in vitro é uma experiência muito pesada.
Os casais procuram saber onde e em que condições os embriões estão congelados?
Alguns sim, mas a maioria não.É como eu lhe disse:estão alienados. A luta que travaram contra a infertilidade foi muito marcante pra eles.(...)Quando o casal engravida, não quer mais tocar no assunto.(...)Ao mesmo tempo, não é inteirado de nada, nem é mesmo convidado a participar dessas discussões sobre o uso de células-tronco embrionárias em pesquisas(...). Não sabem que doar poderia quebrar o arranjo da comodidade."
Além disto, quero colocar um outro argumento que talvez seja considerado romântico e ingênuo mas pra mim é importante: é muito difícil alguém que conviva com pessoas portadoras de doenças como distrofia muscular, diabetes ou hepatite não ser bastante tentado a apoiar as pesquisas.
Pelas razões expostas acima, acredito que, mesmo com todas as questões jurídicas (que devem ser avaliadas dentro da nossa estrutura de um Estado de Direito) e os riscos da nossa querida pátria mãe, as pesquisas devem ser continuadas.
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